Um tempo sem tempo

Acordo. Pego o celular. Uma mensagem no Face, outra no insta e outra igualzinha no zap. Alguém me cobrando alguma coisa, uma resposta, vai saber? Aí, eu penso. É, é tempo de rir. De desespero. Por deste mundo não conseguir mais fugir. Porque parece que estamos em desacordo. O relógio do meu tempo com o das mídias sociais. Sabe aquelas tabelas dificílimas de conversão? Metros pra pés, libras pra quilos, Fahrenheit pra Celsius? Eu vivo assim agora. Tentando me equivaler. Pelo que entendi, há um erro grave no meu tempo. Pois, pra mim, email equivale a uma carta: sua resposta pode chegar de 5 a 7 dias. Úteis, é importante reforçar. No caso do Face, na minha tabela de equivalências, uma resposta razoável chega no prazo de um sedex: de 24 a 48 horas, dependendo do humor. E no meu zap? Ah, tipo um telegrama  (se é que alguém se lembra): até 24 horas tá valendo. Mas no espaço virtual, o meu tempo é irreal. Entrou neste país internetal? Então, troca de tabela, honey. Nesta província,  o tempo “real” é assim: Recebeu? Respondeu! Levou? Bateu! Entendeu?! Nesse instantâneo. Breve, mais breve do que uma pastilha efervescente leva pra desmanchar.  Lembra, quando criança? Cebion laranja era uma brincadeira, não um remédio. Aquela expectativa: ‘Já posso beber, mãe? A pastilha derreteu toda? Quase. Então, não.  Ahhhh.’ E assim eu vou. Tentando me adaptar. E na maioria das vezes, tentando alertar as pessoas sobre o relógio lento do meu tempo. Mas não adianta muito. Parece que a errada sou mesmo eu. Mal educada, falta pouco pra começarem a me chamar: ‘Quem mandou?, não inventou de ter um avatar? Então aprenda a brincar! Acorda, ow. Entenda. Não existe mais essa de ser domingo, madrugada, horário de almoço, dia Santo, véspera de feriado. Natal e ano novo? Ah, paraaaa. Sem essa de pausa pro cafezinho,  cigarrinho no meio do expediente’. É,  parece que toda hora é hora de trabalho e de cobranças nesse mundo sem fuso. Nesse lugar em que o sol nunca se põe chamado web. Nesse espaço em que a noite é sempre dia e todo dia é dia útil. Coitadinhos dos galinhos. Todos demitidos. Justa causa. Não existe mais nascer do dia pra eles cantarem porque a noite nunca chega. Todos, todos vivendo juntos uma insônia coletiva. Insólita. Sem lugar  pra solidão. Todos juntos. Compartilhando um tempo sem tempo, porque toda hora é hora. Todos juntos, educados por uma nova etiqueta que não respeita o sono, o banho, o número dois, o sexo: ‘eu não acredito que você vai parar pra olhar o celular?! Pô, eu tava quase gozando…’ Todos, todos juntos vivendo a tese de que toda hora é hora pra cobrar o email, a resposta no Face, os números de um contato pelo Messenger. Toda hora é hora pra aqueles pontinhos de interrogação que vão se acumulando como se fossem pequenos andares no edifício das perguntas insistentes que nos fazem nossos zaps:

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Ai ai… cansei só de pensar em quantas respostas eu terei que dar, em quantos pontos de interrogação eu deixei acumular, só porque resolvi parar – nem 15 minutinhos – para esse texto poder criar…

Crédito da Foto: Jakub Gorajek.

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