Lisboa é uma cidade muito clara. Talvez pelas construções não serem tão altas, o que faz os olhos alcançarem a amplitude do céu. Ou, quem sabe, sejam as calçadas de pedras brancas a refletirem os raios do sol de baixo para cima. Há segredos nos segredos. E há nas varandas um punhado de desenhos nos ferros das antigas fundições. Um trabalhoso esculpir nas durezas dos minerais que se custam a dobrar. Mas a força do homem gera as formas pelas mãos. Somos escultores a construir nossas ideias na realidade. O abstrato deixa de ser sonho para ir viver na matéria do real. As ruas, exibem os paralelepípedos quadrados, em diagonais. São diagonelepípedos andando por aí com o nome equivocado. Há palavras que não representam aquilo que nomeiam. Em muitos homens também é assim. E as portas… As portas são portais do encanto. Meus passos se param diante delas como quem se curva a uma poesia. São como as gentes, todas diferentes. Impositivas, brutas, coloridas, elegantes, jovens, geriátricas, maciças, leves, amargas, amalgamadas, amáveis, antipáticas, são todas lindas em seus adjetivos, todas portas a nos abrirem os olhos da imaginação para um interior vedado ao espiar do lado de cá. Ao me perder, vou me achando na pátria de Camões. Vou dando passos sobre os chãos que abrigam a história dos tempos, dos templos de tudo aquilo que um dia eu nunca vivi. Até agora.