A solidão chegou. Inverno invadindo primavera. Folhas no chão. Ar de chuva. Silêncio. Cinzidão. A solidão chegou. Seca adentrando rio. Barcos encalhados. Peixes afogados em ar. Esperança arrancada feito raízes do estio. A solidão chegou. Não sei de onde, como. Chegou assim. Como os dias do espanto. Como as dores de um pranto. Feito uma falta de luz no meio da noite de festa. A solidão chegou. Não sabia. Lidar com o escuro é quase um absurdo. Sentei. Silenciei. Esperei. Me vi envolta nela. Feito um feto esperando conhecer o mundo. A crescer dentro da redoma de vida que é toda mãe. A solidão chegou. Não briguei mais. Deixei-a estar. Ela também tem seus momentos. Ela também é um gesto de sentimento. Vem, querida. Se apazigue. Me conte de seus lamentos. Revele-me as angústias de seus tormentos. A solidão se debruçou sobre mim. Chorava, parecia criança desamparada. Varamos a noite conversando. Papo sério. Pesado, daqueles cheios de profundidades e abismos. Caímos juntas. Mãos dadas. Abraços pra lá, beijos pra cá. Sorrimos. Me vi nos olhos dela feito a chama de uma vela. Mal nos amamos, a luz voltou. Procurei por ela. Os quartos, a sala, a cama, tudo vazio? Que nada. Solidão eu agora me chamava ao me descobrir, por mim, muito bem acompanhada… Porque nem toda solidão é perda. Na maioria das vezes, solidão é o nome dos passos a nos construírem uma sólida estrada. Porque nem toda solidão é perda. Na maioria das vezes, solidão é o momento da vida em que nos permitimos, por nós mesmos, o encontro de uma nova entrada.
Crédito da foto: Louis Blythe.