Estive em um deserto. Mês passado, mês presente, mês inteiro. Foi um ano? O deserto longo da solidão voluntária. Solidão por incompreensão minha, de mim para mim. Quem é você, deserto? Havia um deserto. Havia um eu. Mas o deserto era grande e o eu pequeno. Demais. O deserto se estendia por dentro de mim e eu me perdia dentro dele, perdida dentro de mim. Onde acaba um deserto? Onde termina um eu? Havia areias e pegadas. Por todos os lados. Em cada direção. Eu poderia segui-las se soubesse, aliás, se tivesse plena e toda e inteira certeza de que as pegadas não eram minhas. Talvez fossem. Talvez não. E se fossem? Pior? Melhor? Por onde você anda, menina? As pegadas diziam, mas a direção do dentro não sabia das palavras que apontavam para o norte do fora. Nem do sul, nem do sudeste. Só o vento do sudoeste, trazendo as tempestades que moviam as areias. Meu camelo morreu. Eu tive de comê-lo. Minha companhia tinha de ser só minha. Só. E minha. Minha. E só. O camelo era meu. Mas era mais dele. E por isso eu o comi. Não se atravessa desertos sem camelos. Mas não se atravessam camelos nos caminhos do eu. E para sair de meu deserto, sobrou-me perdê-lo. O camelo. O deserto. Eu o comi de dentro para fora. E na dura tempestade de areia, eu usei sua carcaça para me preservar a vida da fome da vida. Eu era a vida dentro do camelo. Ele me gerava em sua morte. E me chocava para que eu pudesse renascer depois da tempestade. As tempestades passam. E os camelos. E as pegadas. E os desertos. E as fomes das vidas. E as vidas. Depois, quando olhei, o chão todo varrido das pegadas. Não restava mais nenhuma. Nada me contava nada de meus caminhos. Nada me apontava nada de meus passos. E eu tive de seguir. Escolhi o lugar onde o sol se põe para longe do norte. Assim, desnorteada, fui. Deixando as pegadas, o camelo, os caminhos, o deserto todo… Todo o mundo ficou perdido. Lá atrás. Menos eu.
Parece interessante. A gente terá talvez a ocasião de discutir pessoalmente sobre isso em BH. Abraços!
– O namorado francês da sua amiga em Berlin –
Olá!
Espero que sim! Venham vocês para BH logo nos visitar!
Abção,
Domingas.