Acordo no meio da noite. É ele. O monstro. Gritando por dentro. Socorro, eu penso. Mas calo. Não quero acordar a casa. Não quero que ele me ache ainda mais. Quero me esconder. Mas ele está muito próximo. Tão perto. É meu íntimo. É quase um monstro-afeto. Ele mora debaixo da minha cama. Mentira. Ele mora debaixo da minha costela. É coisa assim. Apertada. Tão apertada, que espreme até coração, pulmão, minha vida, meus risos, meus dias. Rende. Dura toda a agenda. Não se rende. Como que caça? Será que só eu sou sua presa. Acho que não. Acho que ele ronda. Aceso por aí. Acendendo as pessoas no meio das madrugadas. Acordando a vizinhança. Mas todos disfarçam. Ninguém pronuncia o nome desse demo: ‘Não fala que atrai’, dizem. Eu calo. Mas ele não cala por dentro. Ele grita. Me corrói. Me destrói. E nunca vem desacompanhado. Há uma turma de monstros com ele. Tipo aqueles filmes de terror que misturam lobisomem com vampiro, vampiro com bruxa, bruxa com fantasma, fantasma com medusa. Eles vêm. Todos juntos. Chegam. Abrem a porta do quarto. Que mora debaixo da minha goela. Que vai até meu estômago. Que faz a curva no meu esôfago e oprime a minha respiração. Chegam sem aviso. De surpresa. Num misto de euforia com descrença. Com desânimo. Se fosse uma equação seria a fórmula do fracasso. Uma sensação que te diz que você é uma merda, que nada vai dar certo, que você não merece, essas coisas tristes. Essas coisas insanas. Essas palavras que a alma ouve e fica do tamanho de um bonsai. Uma árvore imensa comprimida numa planta anã. Ali. Mas toda ramificada. Coisa viva, mesmo. Pulsante. Aflita. Te encarando. Esperando você cair. Esperando arrancar teu choro. Esperando que você jogue a toalha e se jogue no chão. Que se arraste. Que acredite na sua própria descrença. Que diga, ok, você venceu. Só que não. Não. Não. Porque eu acendo a luz. Não a do quarto, mas a do peito. E abro a janela. E dou um berro daqueles que ninguém ouve. Quanto mais silencioso, mais poderoso. Eu não acredito em você! Você não sabe nada de mim! E de tanto que eu grito, os monstros se espantam. Pensam: melhor deixar essa louca pra outro filme de terror. E saem por aí. Procurando outras vítimas que não gritam. Para desacreditar.
Crédito da foto: Hailey Kean