Segunda-feira, a vida retoma-se de convenções. Olho pro meu tornozelo… Lá está: a bola de ferro. Me arrasto da cama, porque segunda-feira é o recomeço das semanas, das obrigações, das convenções. E a bola de ferro me machuca. Me arranha o pé, me machuca. Me machuca porque eu não pude escolhê-la, nem ela nem a segunda-feira. Eu não pude escolher a segunda-feira como o dia de descanso e o domingo como dia de trabalho. Chegaram antes de mim e decidiram isso também – como todo o resto – sem que eu pudesse votar. Tampouco pude escolher – ou opinar – sobre as convenções que obedeço, e sigo. Gerações e gerações, já mortas, me decidiram. As convenções me machucam porque me dizem todas as horas. Me dizem as horas próprias para almoço, para jantar, para dormir, para acordar. As convenções me dizem as minhas medidas, o meu peso sobre a balança, o meu saldo devedor no banco. E a cada dia eu me levanto com um peso a mais, um amarrado a mais, uma convenção a mais para enroscar as liberdades do meu dia como um arame farpado. Pois as convenções têm o peso do mundo, o peso de todos os seres humanos juntos, de todas as culturas somadas. As convenções valem todas as guerras, todas as defesas, todas as ideologias, todos os meus ideais. As convenções me invalidam porque não têm preço: valem os créditos das nações. E eu, invalidada, faço o que qualquer escravo faria: me indiferenço. Me indiferenço porque as convenções são como a morte que não podemos evitar… ou fugir. Me curvo sobre as convenções e assino embaixo de todas as suas regras, afinal, é isso ou a loucura, é isso ou o isolamento. Eu tento ser forte, mas sou fraca. Eu tento fugir, mas hoje, como todas as outras segundas-feiras, percebo minha ilusão. Sou apenas mais uma refugiada nesse campo de concentração. Dormi achando que não estava, mas estava… Presa e abatida ao chão das convenções.