Quando alguém decide se mudar de país, esse alguém coloca no papel uma série de somas e subtrações. De um lado, o novo, o sonho, o desconhecido, a possibilidade, a mudança, o recomeço, a oportunidade, a viagem, a reconstrução, os serás… Do outro, o aconchego, o lar, os espaços da cidade, aquela padaria, aquele lugarzinho pro final da festa, aquela ruazinha sem saída com aquele ipê amarelo que te acompanha em todo fim de inverno e início de primavera, aquele feijãozinho com arroz da mamãe, aquele pãozinho-de-queijo da tia, aquele jantarzinho da amiga, aquele drink do amigo, enfim, toda aquela cultura que é sua e de todos os seus, mas que, perto do que vem aí, não vale quase nada. Na lista desse lado de cá, o que pesa de verdade na hora de fazermos as malas são as pessoas. Essa gente maravilhosa que deixamos para trás, nossos verdadeiros lares, nossos autênticos espaços de convivência, nossos cantinhos de afeto, papos, choros, risos, brindes, memórias. Isso, sim, é o grande país que carregamos dentro de nós, a nossa pátria genuína, o nosso onde essencial. São as pessoas que cativamos nos lugares pelos quais passamos que fazem qualquer cidade adquirir aquele valor que não está nos concretos das construções, nas janelas dos arranha-céus, nas imensas avenidas, nas vitrines dos shoppings. Aquele valor que não se encontra à venda, que não se acha nos sinais, que não se perde pelas esquinas: nossa família, nossos amigos, todos os que nos confortam, que conosco se importam, que nos sabem por um simples olhar… A palavra amiga, o colo silencioso, o conforto de dois corpos que se comportam em um só abraço quando aquele diazinho triste bate ou quando aquele motivo de comemoração explode, isso, sim, será o nome da saudade… Ontem, foi a nossa festa de despedida surpresa. Fizeram um varal de fotos, uma história panorâmica de mais de uma década de juntidão. Ver todo aquele passado alinhavado naquelas pessoas foi ter olhos de lágrimas, foi percorrer uma estrada que ia do hoje ao ontem com muita gente cheia de luz. Perceber isso foi muito imenso, pois que foi entender que somos pessoas muito abençoadas, muito iluminadas, já que temos, ao nosso redor, o grande ouro do universo: gente. E gente de coração pleno, cheio, cativante, amoroso, transbordante. É claro que nem todos puderam estar naquele varal ou mesmo na festa, mas, mesmo assim, ausentes, ali estavam. Pois o verbo estar é muito maior do que ele pensa ser. Estar é estar até quando a pessoa não está por perto, vez que pessoas habitam um lugar que não carece de um espaço físico: o lugar do coração. O lugar do coração é um onde que nunca se parte, que nunca se perde, paragem em que as correntes são as da liberdade e os rumos são os ventos do amor. Viver no meio dessa ventania é saber que não importa para onde iremos, nem para onde ventaremos, nosso coração sempre arranjará um jeito especial de manter nossas pessoas perto de nós. Nossas pessoas que são parte de nós. A parte mais sincera, singela, profunda. E compreender isso fez a árdua tarefa da despedida, apesar de todo choro envolvido, tornar-se uma coisa leve e alegre. Porque descobrimos que o coração é o cofre do inquebrantável. Aquilo que nele se guarda não se perde jamais.
*A todos que fizeram parte de nossa trajetória, nosso sincero muito obrigada. Suas vidas fizeram das nossas vidas um lugar em que não cabe outra palavra além de ESPECIAL.