É tão bom mudar e crescer e ver que o tempo vem pra nos trazer alguma coisa além de um somatório de anos. O tempo nos traz compreensão. Um entendimento de nós mesmos que antes não tínhamos. Éramos imaturos. Imaturos incapazes de nos lermos por dentro. Hoje, não somos. Aprendemos nosso alfabeto e respeitamos nossas caligrafias tortas. É à mão mesmo que nos escrevemos. Sem borrachas que nos apaguem os erros.
Temos as mais variadas formas. Pessoas para todos os gostos. Gente velha envelhecendo em corpo jovem. Gente criança de castigo em corpo maduro. Vai saber. Cada um é cada um. Cada um é todos nós. Somos todos um só padrão, com um número limitado de regras e de letras que, ao se combinarem de formas distintas, geram um novo texto, uma nova história. Nada muito exótico, nada muito excêntrico. Ninguém é muito além do que a humanidade nos prevê.
Nossa previsibilidade nos nasce porque somos humanos. E por que somos humanos? Somos humanos para entendermos que as coisas mais complexas são as mais simples. Somos humanos para entendermos que as coisas mais valiosas são as mais gratuitas. Você lembra quanto você pagou pela sua vida? O amor é gratuito, o sol é gratuito, o sorriso… Ah, quanto vale mesmo um sorriso? Um sorriso vale o mundo. Um sorriso vale uma vida feliz e ele não custa nada. Nadica de nada.
A partir de hoje eu não me preocupo mais com a vida. Ela é que ocupará de mim. Eu viverei e andarei sobre ela, dentro dela, e ela estará em mim como uma bactéria vital. Seremos assim… Inseparáveis. Talvez a passagem do tempo é que tenha me presenteado com essa sensação. A sensação de que o tempo passa e de que a vida, de tão valiosa, é tão curta. E é, justamente, por descobrirmos esse encurtamento das pernas da vida, que a gente entende que nossa anatomia foi projetada para nos fazer andar pra frente. Para frente em busca de um crescimento interno que nos faça dar flores e frutos capazes de alimentar, com afeto e beleza, aqueles que nos cercam.
Não sou a mesma de ontem. Tampouco serei a mesma de amanhã. Nem faço mais questão. A mudança do mundo é muito menor do que a minha própria mudança, do que a minha redecoração interna, minhas auto-reformas… A cada dia que passa, eu vejo o quanto é importante nos reservarmos algumas prateleiras dentro de nós para o nosso crescimento…
Crescer não é envelhecer. Crescer é nos aumentar de dentro pra fora, nos esticar os limites, nos expandir os terrenos da alma numa sede desenfreada de espaço… O nosso crescimento faz isso, nos torna sedentos por um espaço que é nosso e está dentro de nós, mas que não sabemos onde fica e nem onde se perdeu. Será debaixo da escada? Ali, naquele local inóspito onde só cabem entulhos e quinquilharias mortas? Sim. Exatamente ali. Ali, naquele meio-porão cheio de bagulhos e mágoas, está o espaço que nos abrirá espaços por dentro.
Para existir, o crescimento precisa nos esvaziar as gavetas que não fazem sentido. Para nos habitar, o crescimento precisa nos desentulhar. Há vezes em que a vida nos suga a alma com sua solidão insolente para que nos remodelemos e nos criemos novos espaços para crescer. Afinal, como nós, nosso crescimento é vivo; vivo e espaçoso o suficiente para deixar que a vida corra solta. Soltíssima dentro de nós.