Vestimos nossa originalidade nas marcas de nossas roupas. Pagamos carros do ano em 48 prestações, porque precisamos provar que temos algo de diferente em nós para mostrarmos. Tomamos remédios contra a ansiedade, porque nos enchemos de estímulos fúteis. Somos consumistas, claro, sem ideais, o que mais poderíamos ser? Adquirimos nossa “auto”-ajuda em livros de supermercado, mas temos a solução para a vida de todo mundo. Sabemos de cor todas as frases clichês e acreditamos com veemência na inteligência burra do senso-comum. Reclamamos da política do país, mas não lembramos em quem votamos na última eleição. Nos masturbamos com cifrões, mas achamos um absurdo a usura dos bancos. Preferimos pagar aluguel para morar na zona sul do que viver num apartamento próprio no subúrbio. Transformamos o amor num produto de classificados e encontramos a solução para as brochadas da vida nas ereções das pílulas azuis. Teimamos em acreditar que existem mulheres sem celulite e ainda confundimos fama com sucesso. Tomamos colágeno depois dos 30 para firmar a pele, mas ainda não sabemos o que tomar para levantar nossa auto-estima. Jogamos as finais dos campeonatos contra nós mesmos e depois não entendemos por que somos sempre vices. Falamos mal das pessoas autênticas pelas costas, porque somos covardes sem cara para sermos quem somos pela frente. Nos enchemos de declarações falsas para tentarmos convencer o mundo de que estamos convencidos de qualquer coisa. Tiramos fotos de nossos melhores momentos para que eles possam existir, de fato, ao serem publicados no Facebook. Tornamos públicas as maravilhas de nossas vidas para que nossas tristezas íntimas fiquem bem escondidas atrás dos holofotes. Temos 247 amigos virtuais, mas nenhum confidente real. Decoramos o refrão de nosso hino nacional porque somos “patriotas”, mas sabemos que a melhor maneira de se ter “orgulho de ser brasileiro” é fugindo para o exterior. Pensamos que pensamos, só para não termos o trabalho de pensar. Encaramos a violência com o rabo entre as pernas, porque é melhor morrer num assalto do que cobrar do governo que ele faça o que lhe cabe fazer. Reclamamos da exploração dos países desenvolvidos, mas continuamos achando normal que a maioria de nossas faxineiras sejam negras. Falamos mal das prostitutas, porque esquecemos que são nossos amados maridos quem as empregam. Condenamos as drogas, porque fingimos que não são as mesadas de nossos queridos filhos que as consomem. Censuramos os drogados, porque acreditamos que não fomos pais que trocaram a atenção devida aos filhos por brinquedos. Justificamos sermos seres perdidos porque vivemos sem respostas. Mas, na verdade, somos seres que se perderam ao acharem-se sem perguntas.