“Não dá”, é o que não dá pra ouvir. Não acredito nessas assombrações que se transvestem em frases. Coisa de gente sem fé que adormece enforcada em corda de incredulidade. Eu acredito. Em uma força superlativa e sem nome muito maior que a minha e que me dá forças para acreditar em mim. Sei que com toda a minha imperativa finitude não posso ser chegada, ponto final de nada. Sou apenas o processo da vida que se processa no tempo certo. No tempo de construção de asas que me dão asas pra voar mais alto, pra viver mais alto.
Se a vida é só isso, então, só isso será tudo. Todo tempo verbal do meu viver será em modo de presente do indicativo: “eu vivo”. Eu vivo. Eu vivo de metamorfoses que é pra me dar mais sobrevida; que é pra parecer que eu posso viver mais, vivendo em paralelos espaciais dentro de mim…. É um torpor que me abriga em sonho fora de sono, me esquentando os pés como sapatinhos de lã da vovó e me alimentando de pasta de gana de crescer em passagem… É ser como o rio que, no inverno, parece morrer congelado na superfície estática, mas, ali, embaixo do gelo frio, tem um movimentar de águas correntes que me vêm trazer a torneira aberta pra que eu lave o rosto de manhã com meu sabão de corpo. Pra que eu me sinta nova como o dia que nasce no sol…
Não há lugar pra nós em tanta vida porque não há lugar. Lugares são somente pessoas que nos recebem em suas cidadelas com cafés servidos em copos lagoinhas. E pessoas são efervescências de ideias que sobem da pastilha que derrete no fundo do copo pra explodirem em ar de felicidade… Gosto de pessoas. Muito. Mas dosar confiança é o caos… E pessoas são seres desconfiáveis ao compartilhar. No início, nunca desconfio. Distribuo fidúcia como bala jogada avulso em festa infantil. E fico ali, como a pescar mãos. Deixando a confiança amadurecer na ponta da vara, isca de minhas próprias conclusões, observatórios de atitudes… Mas, conforme o vento passa levando a poeira do tempo, fica fácil avaliar seus níveis de cálcio. Pois confiança é que nem osso na velhice. Frágil e, uma vez quebrada, torna-se muito difícil de alcançar a rigidez de antes. Mas vale a tentativa. Por quê, não?, se somos todos seres desconfiáveis?!
Tudo o que a vida nos dá são chances de tentar. Pena nos agarrarmos mais à desistência do que verdadeiramente ao fracasso. Prefiro apostar nas tentativas com alta margem de erro. Ali se abriga o risco do me arriscar a receber mais. Vou em frente, bicando grãos de despreocupação que alimentam os pássaros das gaiolas de mim. O “se entreter” com o mundo é a ritalina que nos faz dóceis à paciência…
Quero escolher o que quero sem influências de opiniões externas. Enquanto eu não te pedir, guarde a sua opinião na carteira e use-a pra comprar o quer der pra você. Ela é como moeda estrangeira. Bonitinha. Dá até pra ficar com um pouco, mas, uso prático, mesmo, não vejo nenhum… Ao menos enquanto eu não te solicitar, deixe-me continuar no meu passo torto, girando em assovios. Só estou tentando rolar como manda o ditado: pedra que não rola só cria limo e faz escorregar os outros. E não quero esses tombos nas minhas costas. Não enquanto não houver uma pena tipificada pra culpa.
Quero escolher as minhas escolhas, porque assim serei o que “eu” quero. Sei que no dia em que eu me atrever a crer, como hoje, o universo se tornará a minha torcida e os goles dessa partida sairão dos meus pés marcados pelos chutes nas questões de múltipla-escolha da vida. E se a nota for de reprovação? Que seja. Não aproveito meu boletim pra nada. Sou – e somos – só um processo, esqueceu?!